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domingo, 19 de março de 2023

A IGREJA DENTRO DA LEI - Estatuto de Congregações

Por Adiel Teófilo.

Existem muitas denominações evangélicas no país que possuem várias congregações filiadas a uma igreja sede. Sabemos que não raras vezes, a maioria dessas congregações funcionam de maneira informal, sem estatuto registrado que lhes assegure personalidade jurídica própria como uma organização religiosa. A dúvida mais recorrente de grande parte dos líderes de igrejas é se as congregações podem de fato ter estatuto próprio, e ainda, se ao registrar um estatuto, as congregações passariam a ser independentes da igreja sede, ganhando assim plena autonomia.

A resposta a essas indagações é que as congregações podem sim ter estatuto próprio, sem que isso implique necessariamente em conceder total autonomia administrativa e eclesiástica a essas congregações filiadas à igreja sede. Isso porque no próprio estatuto podem constar normas que especifiquem como estão organizadas as congregações, detalhando também o seu funcionamento como unidade vinculada a uma igreja sede.

Desse modo, o estatuto não descaracteriza os aspectos que são inerentes a uma congregação. Muito pelo contrário, nesse documento podem constar todas as atribuições e responsabilidades que devem ser observadas ao se administrar uma congregação, harmonizando assim o seu funcionamento com a estrutura administrativa e eclesiástica da igreja sede a que está vinculada. Constata-se, portanto, que o estatuto consolida a estrutura administrativa, na medida em que as normas de funcionamento da congregação passam a ser escritas e documentadas, exigindo o seu fiel cumprimento.

Além disso, outras vantagens decorrem de se ter um estatuto próprio para a congregação. É possível abrir conta bancária em nome da congregação como pessoa jurídica, evitando movimentar recursos financeiros em nome do tesoureiro ou do dirigente, como ocorre frequentemente na prática. Os atos e contratos da vida civil podem ser praticados em nome da congregação, a exemplo do contrato de locação de imóvel, contratos bancários, notas fiscais, dentre outros. Essa medida é importante para evitar confusão entre obrigações da congregação e obrigações do dirigente, bem como evitar confusão patrimonial, acarretando muitas vezes prejuízos para a congregação.

É importante ressaltar que nem sempre os oficiais de cartório do registro de pessoas jurídicas compreendem a vinculação que existe entre congregação e igreja sede. A experiência de registro promovida aqui no Distrito Federal revelou essa realidade, pois há oficiais que também interpretam que o estatuto concederá plena autonomia à congregação. Foi necessário explicar como se organiza e funciona essa estrutura dentro da denominação, usando como exemplo a organização político-administrativa do Estado Brasileiro, constituído por União, Estados e Municípios, todos autônomos, porém formando a República Federativa do Brasil, nos termos do art. 18, da Constituição Federal.

A par desses esclarecimentos, foram registrados os estatutos de congregações que funcionavam há vários anos em Cidades do Distrito Federal. Algumas possuíam inclusive imóvel próprio, porém pendente de registro imobiliário, o que pode agora ser regularizado, inclusive para fins de obtenção da isenção do IPTU. Portanto, recomenda-se que as congregações saiam da informalidade e promovam o registro de estatuto próprio, obtendo dessa forma capacidade jurídica para exercer os direitos e responsabilidades que lhe são inerentes, sem contudo perder a condição de congregação vinculada a uma igreja sede.     

terça-feira, 26 de maio de 2020

A IGREJA E O CORONAVIRUS


Por Adiel Teófilo.

O Brasil vem enfrentando a pandemia do coronavirus (Covid-19), desde o dia 20 de março de 2020, quando o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo nº 6, reconhecendo o estado de calamidade pública. Essa data marca o início da implantação em todo o território nacional de diversas medidas de enfrentamento da pandemia, sendo que em alguns Estados e Municípios foram impostas regras de isolamento social, restrição de várias atividades e proibição de aglomeração de pessoas. Essas medidas inevitavelmente atingiram o funcionamento das igrejas, impedindo a realização das suas atividades e celebrações coletivas regulares.
Diante disso, as denominações evangélicas, principalmente aquelas que não possuem programas de rádio e/ou televisão, foram forçadas a buscar rapidamente outros meios de manter o contato com os seus membros. Nesse sentido, as redes sociais foram de grande valia, pois viabilizam o contato virtual com a membresia, a custo baixo, através de aplicativos e canais de comunicação pela internet, possibilitando, embora à distância, a realização das celebrações religiosas, como cultos, escolas bíblicas e ministração da Ceia ordenada pelo Senhor Jesus Cristo.
O desafio da igreja fora dos templos
Nesse tempo de pastoreio e ministrações à distância, o grande desafio para líderes e liderados é continuar sendo Igreja mesmo fora dos templos. A habitualidade das celebrações presenciais durante a semana foi substituída de forma súbita e inesperada por momentos on line, nos quais não há proximidade afetiva entre as pessoas, nem a interação direta entre os integrantes da comunidade local. Não resta dúvida de que esse afastamento social implica numa perda substancial da qualidade dos cultos e na impossibilidade de se desenvolver uma comunhão cristã íntima entre o povo. 
Esses problemas não ocorrem apenas em razão do isolamento social em si mesmo como medida de contenção da pandemia. Eles são ocasionados também por outras deficiências, como a inabilidade de certas pessoas em lidar com as novas tecnologias da informação, as distrações comuns da rotina do lar, e ainda, as dificuldades de muitos crentes em realizar devocional familiar, que propicie o ambiente favorável à participação exitosa nas ministrações à distância.  
Além disso, precisamos considerar uma realidade presente em várias denominações evangélicas.  Há igrejas que não constroem a visão voltada ao aprimoramento da comunhão entre os seus membros fora do ambiente dos templos, nem aplicam práticas capazes de tornar a vida cristã num estilo de vida mais comunitário e menos restrito ao templo. As igrejas com desenvoltura nessa prática são aquelas que realizam frequentes atividades com grupos menores, funcionando no âmbito familiar, qualquer que seja a nomenclatura atribuída ao programa. Criam dessa forma condições favoráveis para gerar intensa comunhão, o que pode ajudar bastante a superar o distanciamento em tempo de crise como esse que enfrentamos. Talvez seja necessário reinventar a forma de expressar a comunhão da igreja como preparação para situações semelhantes no futuro. 
Esse ambiente de restrição social causado pelas medidas decorrentes da pandemia, que vem se estendendo ao longo de semanas em vários Estados da Federação, deve ser ainda objeto de cuidadosa reflexão acerca dos impactos que pode causar nas igrejas evangélicas em todo o país. E aqui é pertinente fazer um importante registro: a Igreja como Corpo de Cristo na Terra não se abala nem se detém diante de pandemias, calamidades ou perseguições, mas permanece firme sobre a Rocha, a Pedra de Esquina, na qual está edificada, prevalecendo contra as portas do inferno.   
A Igreja, no entanto, como Corpo Local, constituída por pessoas que se reúnem sob as diversas denominações evangélicas, pode sofrer alguns impactos consideráveis, provocados por essa mudança repentina de comportamento social, que foi imposta a toda sociedade como forma de minimizar os efeitos da pandemia.
O impacto espiritual
O primeiro reflexo que algumas igrejas podem experimentar é o impacto espiritual. Isso diz respeito diretamente aos seus membros, pois cada pessoa reage de forma diferente em face das mesmas circunstâncias. É semelhante à reação de alguns alimentos que passam pela água fervente: a cenoura amolece, o ovo endurece no seu interior, e, o pó de café se mistura à água dando-lhe cor e sabor.
Desse modo é possível que o isolamento social provoque em determinados cristãos maior fervor espiritual. Podem crescer no temor a Deus, aproximando-se do Senhor Jesus por meio de orações, súplicas, leitura e meditação da Escritura, ainda que premidos por certas dificuldades inerentes à pandemia. O calor da provação produz neles o quebrantamento espiritual e a dependência do Senhor Jesus. Certamente precisarão ser trabalhados, visando manter o fervor espiritual mesmo depois que cessar a calamidade.   
Outros cristãos, infelizmente, poderão declinar para o esfriamento espiritual, diminuindo o zelo, a comunhão e até mesmo a fé no Senhor Jesus. Pode ocorrer que se afastem gradativamente do Evangelho, como consequência do distanciamento da vida cristã comunitária, ou ainda, que se tornem pessoas de coração endurecido, resistente e questionador, quanto ao propósito de Deus em meio a essa pandemia que tem ceifado milhares de vidas em todo o mundo. Nesses, o calor da provação gera indiferença, incredulidade e isolamento do Corpo de Cristo. Será necessário esforço para resgatar e restaurar esses crentes à comunhão dos santos.
Temos ainda, para a alegria do Senhor e satisfação da liderança, o grupo dos crentes fiéis. É formado por aqueles cristãos maduros e experimentados na fé, que não se abalam no tempo da adversidade, nem se desanimam no momento da calamidade, mas permanecem firmes e confiantes na direção e provisão que vem de Deus. Aprenderam a ter fartura e também a passar por escassez, sabem desfrutar da alegria dos ajuntamentos solenes e também enfrentar a solidão do isolamento social, pois em toda e qualquer situação o Senhor é Quem lhes fortalece. Para esses, a adversidade é momento oportuno para crescer na fé e compartilhar o amor e a salvação em Cristo a todos quantos puderem falar. Resta-nos ser gratos a Deus por esses crentes que dão o verdadeiro sabor de Cristo a essa geração.
Essas são, de modo geral, algumas das consequências espirituais que podem afetar os cristãos nesse tempo de pandemia. O que realmente vai acontecer com cada Igreja Local, somente será possível avaliar no pós-pandemia, quando for restabelecida a normalidade dos cultos e demais celebrações coletivas presenciais. Cabe a cada líder ter a sensibilidade e o discernimento necessários para compreender o que se passa no coração dos seus liderados, buscando assim suprir as carências espirituais de cada um.

O impacto emocional
Outra consequência inegável da pandemia é o impacto emocional. Não há registro na história recente de tempo como esse em que todas as pessoas ficaram confinadas em suas próprias casas, por longo período, para evitar a contaminação por uma grave doença. Esse recorte temporal deixará marcas emocionais profundas na vida de inúmeras pessoas, que foram tomadas por medo, ansiedade e insegurança, provocadas por uma série de fatores, que vão desde a pouca confiança no cuidado e proteção do Senhor, passando pela falta de orientação adequada para enfrentar esse período, até a nefasta influência de alguns setores da mídia, que diuturnamente divulgam as piores notícias possíveis sobre a pandemia, cumprindo uma agenda política.
A mensuração desse impacto emocional só será possível fazê-la também no pós-pandemia. A partir do momento em que for autorizado o retorno às atividades regulares da Igreja, a ausência de algumas pessoas poderá ser motivada por consequências emocionais provocadas pela pandemia. Não se pode menosprezar o fato de que poderão estar alimentando grande receio de fazer parte dos ajuntamentos, ainda que obedecidas rigorosamente as recomendações das autoridades públicas de saúde no interior dos templos. Será necessário tempo e acompanhamento para que restabeleçam a confiança e retornem à normalidade do convívio social em todos os seus aspectos.
Por outro lado, o conforto, a comodidade e a segurança de participar em casa das celebrações virtuais da igreja poderão concorrer para alimentar certo distanciamento do templo. É bem verdade que muitos preferem a proximidade e o contato pessoal, mas também há pessoas que se comportam de forma diferente, que consideram como suficiente os contatos virtuais e a comunicação à distância, as quais podem facilmente transferir esses conceitos para as ministrações dos cultos pela internet. Lidar com essa situação requer habilidade para comunicar os ensinos da Escritura que ressaltam a importância da comunhão pessoal entre os membros do Corpo de Cristo.   
O impacto financeiro
Outra situação que pode atingir as organizações religiosas é o impacto financeiro. É notório que no combate à pandemia, o comércio em geral foi fechado e foram totalmente suspensas inúmeras atividades públicas e privadas. Isso tem provocado a falência de milhares de empresas e a demissão em massa de milhões de trabalhadores, aumentando drasticamente o número de desempregados que perderam a sua fonte de renda. O reflexo dessa lamentável conjuntura econômica sobre as igrejas é inevitável, pois muitos crentes não poderão continuar contribuindo com dízimos e ofertas nos mesmos valores que faziam antes dessa crise.
Essa perda de arrecadação poderá afetar duramente o custeio e a manutenção das igrejas. Aquelas em que for elevado o número de membros desempregados, com a consequente redução das contribuições, poderão enfrentar várias dificuldades para honrar os seus compromissos, como prebenda pastoral, salário de funcionários, tarifas de energia elétrica, água, telefone, dentre outras. Até mesmo a existência de algumas igrejas poderá ficar comprometida, na medida em que não conseguirem levantar os recursos suficientes para pagar o aluguel do templo.
Tudo isso demonstra que será necessário reorganizar as despesas, reduzir custos e estabelecer prioridades, visando manter a continuidade e o funcionamento da instituição dentro da nova realidade financeira que se avizinha. É preciso pensar que diante dessa crise econômica anunciada, cuja gravidade e repercussão não são totalmente conhecidas, poderá ser necessário prestar assistência material a número elevado de membros e congregados, demandando volume maior de recursos financeiros para a área social.       
Por outro lado, poderá ser necessário também reformular a programação especial das igrejas, como forma de enfrentar o período de crise econômica e manter a realização de vários eventos. As atividades dispendiosas e que oneram financeiramente os membros, como viagens em grupo, encontros em hotéis e jantares em restaurantes, poderão ser substituídas por programas que sejam simples, porém agregam mais pessoas e tenham menor custo. A criatividade e a capacidade de adaptação serão imprescindíveis para superar os desafios financeiros gerados pela pandemia.
A esperança no Senhor Jesus Cristo
Enfim, a pandemia do coronavírus deixará sua profunda cicatriz na história da humanidade, criando um novo tempo em que nada na sociedade poderá ser como antes. As consequências sociais e econômicas geradas pelas medidas restritivas de combate à pandemia certamente lançarão seus reflexos sobre a existência e o funcionamento de diversas igrejas em nosso país. Resta-nos diante dessa calamidade, rogarmos ao Senhor da Igreja para que ajude os membros do Corpo de Cristo a enfrentar as dificuldades com paciência, fé e esperança, na certeza de que o Senhor Jesus Cristo sempre tem o melhor para os seus escolhidos.   


sexta-feira, 10 de abril de 2020

A IGREJA DENTRO DA LEI - Pagamento de Direitos Autorais

Por Adiel Teófilo. 

As igrejas evangélicas se utilizam durante as suas celebrações, com bastante frequência, da apresentação de inúmeras composições musicais. Essas apresentações acontecem no interior dos templos em reuniões públicas, bem como muitas vezes são transmitidas por radiodifusão, televisão ou em redes sociais pela internet.
Diante disso, surge o questionamento se organizações religiosas estariam obrigadas ou não ao pagamento de direitos autorais por execução pública de obras musicais. A dúvida ainda persiste, mesmo diante do fato de que as apresentações musicais ocorrem mediante a participação dos próprios membros da igreja, os quais atuam em grande parte como cantores de forma não remunerada.
Considerações legais sobre os direitos do autor de obra intelectual
Os direitos do autor e os que lhes são conexos estão previstos na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. São protegidas por essa Lei as obras intelectuais expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, dentre elas as composições musicais que tenham ou não letra.
Ao autor intelectual pertencem os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que ele criou. Dentre os direitos morais, os quais são inalienáveis e irrenunciáveis, está o de ter o seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra.
No rol dos direitos patrimoniais consta que depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como a reprodução parcial ou integral; a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações; a inclusão em fonograma ou produção audiovisual; a utilização, direta ou indireta, da obra artística mediante execução musical, a exibição audiovisual, cinematográfica ou por processo assemelhado.
Os direitos patrimoniais do autor de obra intelectual perduram por setenta anos contados de primeiro de janeiro do ano subsequente ao de seu falecimento. Após o decurso desse prazo de proteção a obra passa a pertencer ao domínio público, bem assim as obras de autores falecidos que não tenham deixado sucessores, e aquelas obras cujo autor seja desconhecido.  
A par dessas considerações sobre os direitos autorais, cabe tecer alguns comentários acerca do que a Lei denomina de Comunicação ao Público. Estabelece que não poderão ser utilizadas composições musicais ou litero-musicais ou fonogramas, em execuções públicas, sem a prévia e expressa autorização do autor ou titular do direito autoral.
A própria Lei define como execução pública a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de frequência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, incluída nesse último caso a transmissão por rede mundial de computadores mediante as plataformas e redes sociais disponíveis.
Nesse sentido, o art. 68, § 3º, da Lei em apreço, assim dispõe:
§ 3º Consideram-se locais de frequência coletiva onde se representem, executem ou transmitam obras literárias, artísticas ou científicas, como teatros, cinemas, salões de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de qualquer natureza, lojas, estabelecimentos comerciais e industriais, estádios, circos, feiras, restaurantes, motéis, clínicas, hospitais, órgãos da administração pública direta, autárquica e fundacional, empresas estatais, meios de transporte de passageiro terrestre e aéreo, espaços públicos e comuns de meios de hospedagens e de meios de transporte de passageiros marítimo e fluvial. (sem grifo no original)
Observe que esse dispositivo legal elenca quais são os ambientes considerados como locais de frequência coletiva, onde poderá ocorrer o que se chama execução pública, e, consequentemente, exigir-se a prévia e expressa autorização do autor ou titular do direito autoral. Compreende-se nessa autorização o pagamento relativo aos direitos autorais, cujo comprovante, via de regra, deverá ser apresentado ao escritório central de arrecadação – ECAD, previamente à realização da execução pública.
Proposições legislativas sobre direitos autorais
Importante acrescentar que a Medida Provisória nº 907, de 26 de novembro de 2019, deu nova redação ao dispositivo legal acima transcrito. O texto foi publicado no Diário Oficial da União de 27.11.2019, republicado em 28.11.2019, retificado em 16.1.2020 e retificado em 17.1.2020.
Essa Medida Provisória incluiu o § 9º ao art. 68 da Lei dos Direitos Autorais. A finalidade dessa inclusão foi a de extinguir a cobrança de taxa do ECAD em relação aos quartos de meios de hospedagem, no caso de hotéis e pousadas, bem como quanto às cabines de embarcações aquaviárias, para uso exclusivo de hóspedes.
Desse modo, definiu que não incidirá a arrecadação e a distribuição de direitos autorais, quanto a execução de obras literárias, artísticas ou científicas no interior das unidades habitacionais dos meios de hospedagem e de cabines de meios de transporte de passageiros marítimo e fluvial. Essa matéria era objeto do Projeto de Lei do Senado nº 206, de 2012, cuja proposta foi arquivada em 18 de dezembro de 2019.
Tramitava também naquela Casa o Projeto de Lei do Senado nº 100, de 2011, visando alterar a Lei de Direitos Autorais, para isentar da arrecadação de direitos autorais a execução, por qualquer meio, de obras musicais ou lítero-musicais no âmbito de cultos, cerimônias ou eventos realizados por organizações religiosas, sem objetivo de lucro. Essa proposição legislativa infelizmente foi arquivada em 21 de dezembro de 2018.
Condição diferenciada das organizações religiosas
 As organizações religiosas são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos. A sua criação, organização, estruturação interna e funcionamento são livres, conforme disposto no § 1º do Art. 44, do Código Civil.
No tocante à Lei de Direitos Autorais, constata-se que no rol do § 3º do art. 68, transcrito acima, não estão expressamente incluídos os templos religiosos. De fato, as igrejas não estão mencionadas como locais considerados de frequência coletiva, onde ocorreriam as execuções públicas sujeitas à autorização prévia e expressa do autor, bem como ao pagamento relativo aos direitos autorais.
Não obstante, após a edição da Lei de Direitos Autorais – Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que alterou, atualizou e consolidou a legislação sobre direitos autorais, surgiram posicionamentos divergentes quanto à obrigatoriedade do pagamento dos direitos autorais pela execução pública de obras musicais nos cultos religiosos.
Prova disso é que na Justificação do Projeto de Lei do Senado nº 100, de 2011, foram delineados os seguintes argumentos fáticos e jurídicos:
Nos termos da Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, para qualquer representação ou exibição pública de obras teatrais, musicais ou lítero-musicais, há a necessidade de autorização do autor ou titular de direito patrimonial do autor, com o respectivo pagamento ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD), independentemente de haver objetivo de lucro.
Essa norma, especialmente se considerarmos a existência de associações desprovidas de fins econômicos, como as de cunho religioso, protege excessivamente o autor ou titular de tais obras, em detrimento do interesse geral da coletividade, criando obstáculos à difusão da cultura e, particularmente, da manifestação religiosa.
Conquanto a jurisprudência venha se inclinando para a tese de inexigibilidade de cobrança de valores quando o evento seja organizado por entidades religiosas, o Ecad, invariavelmente, realiza a cobrança, conduzindo a discussão para a esfera judicial, em nítido prejuízo para os interessados. Para pacificar a controvérsia que ainda hoje paira sobre a matéria, alvitramos isentar do recolhimento de direitos autorais a execução de obras musicais ou lítero-musicais em cultos, cerimônias e eventos organizados por entidades religiosas em que não haja intuito de lucro, direto ou indireto.
Nas palavras de Carlos Alberto Bittar, “há o incontestável interesse coletivo na difusão de obras intelectuais; existe a necessidade de acesso de diferentes camadas populacionais [...] aos textos e obras públicas; e impõese a expansão da cultura como esteio do desenvolvimento geral da nação. [...] Por essa razão é que certos interesses de caráter público têm imposto balizas aos direitos autorais ao longo dos tempos, em todos os países, as quais se refletem no direito positivo, por meio de formulação de regras de exceção, que vêm a mitigar o caráter absoluto da exclusividade conferida ao autor”.
[...]
Em suma, entendemos que, desde que a representação ou execução pública da obra se dê no âmbito de evento destinado à manifestação religiosa e sem finalidade lucrativa, não há por que sujeitá-la à prévia autorização e, especialmente, à arrecadação de valores por parte do Ecad, tendo em vista que os responsáveis não auferirão nenhuma vantagem pecuniária e, portanto, não tirarão proveito econômico algum das obras utilizadas, não havendo, pois, ofensa aos direitos patrimoniais do autor.
Por outro lado, a Exposição de Motivos nº 00024/2019, de 18 de novembro de 2019, subscrita pelos Ministros da Economia, do Turismo, e da Infraestrutura, que referenda a Medida Provisória nº 907, ao tratar da inserção do § 9º ao art. 68, da Lei de Direitos Autorais, conforme comentado acima, apresentou as seguintes considerações:
[...]
9. Ressalta-se que o Ecad arrecada direitos não só de rádio, TV e shows, mas também de bares, academias, clínicas médicas, hospitais, carros de som, terminais de transporte, restaurantes, meios de hospedagem, e até mesmo festas de casamento, festas juninas, quermesses, bem como vídeos e áudios em formatos MP3, MP4 ou assemelhados que transitam no âmbito da internet. Ficam isentas das custas de pagamentos das taxas do Ecad, os eventos particulares em propriedade privada, que não haja cobrança de ingresso, cultos religiosos em geral e eventos com fins educacionais. (grifamos)
 É de se ver que a aludida Exposição de Motivos estriba-se no entendimento de que os cultos religiosos não são abrangidos pelo rol do § 3º do art. 68, da Lei dos Direitos Autorais. Nessa linha de compreensão, as igrejas não estão incluídas nos locais considerados como de frequência coletiva, para fins de execuções públicas de obras musicais sujeitas à autorização prévia e expressa do autor, bem como não estariam sujeitas ao pagamento de direitos autorais.
Diante dessas proposições e o mais que na doutrina consta, pode-se afirmar que o entendimento majoritário inclina-se no sentido de excluir as exposições públicas de obras musicais, no decorrer de cultos religiosos, da obrigatoriedade do pagamento relativo aos direitos autorais dessas obras.
No entanto, convém ressaltar que podem surgir demandas e até mesmo decisões judiciais favoráveis à cobrança do referido pagamento, enquanto não se consolidar o entendimento de que o rol do § 3º do art. 68, da Lei de Direitos Autorais, é taxativo. Isso é, que esse dispositivo elenca expressamente todos os espaços considerados locais de frequência coletiva para os fins que a Lei especifica, não podendo ser interpretado exemplificativamente para abranger os cultos religiosos.
Outra possibilidade é a edição de norma legal alterando a Lei de Direitos Autorais, para excluir expressamente da obrigação do pagamento de direitos autorais, os cultos, cerimônias e eventos promovidos pelas organizações religiosas em que não haja intenção de lucro na execução pública de obras musicais. Isso afastará em definitivo qualquer controvérsia acerca da matéria em pauta.
Aplicações práticas para as organizações religiosas
A par dessas considerações e tomando por base o episódio de que o canal de uma igreja evangélica foi bloqueado no You Tube, por suposta violação de direito do autor de obra musical, convém apresentar algumas orientações que podem ser aplicadas no âmbito das organizações Religiosas.
O referido bloqueio ocorreu mediante notificação de violação de direitos autorais, promovida por usuário na própria plataforma de compartilhamento de vídeos. Na Central de Ajuda da plataforma estão disponíveis diversas informações sobre a reivindicação e avisos de direitos autorais, inclusive quanto ao procedimento para resolução do aviso de direitos autorais. Através desse canal de comunicação, o fato acima referido foi solucionado oportunamente, com os devidos esclarecimentos.
Segue o link da Central de Ajuda:                               
Muito embora seja predominante o entendimento de que as exposições públicas de obras musicais durante os cultos religiosos não estejam sujeitas ao pagamento de direitos autorais, os usuários podem adotar providências durante a utilização das redes sociais que concorram para evitar eventual notificação e bloqueio por suposta violação de direito autoral. Dentre essas providências, podem ser elencadas as seguintes:
a) durante toda a transmissão ao vivo ou gravação dos cultos, exibir o logotipo da denominação, bem como constar a legenda informando que se trata de culto religioso, mencionando expressamente a denominação, visando assim identificar a natureza do conteúdo do vídeo a ser exibido nos aplicativos e redes sociais;
b) ao iniciar o louvor, inserir se possível legenda constando o nome do autor da letra e da melodia de cada obra musical que fará parte do vídeo, a fim de atender o direito moral do autor de ter o seu nome ou pseudônimo indicado ou anunciado durante a utilização de sua obra musical; e,
c) sendo necessário eventualmente exercer a defesa da Igreja no sentido de que não incorreu em violação de direito patrimonial do autor de obra musical, expor como fundamentos as considerações jurídicas apresentadas neste artigo, especialmente o entendimento predominante de que os templos religiosos não se sujeitam ao pagamento relativo aos direitos autorais, por não constar expressamente do rol previsto no § 3º do art. 68 da Lei de Direitos Autorais, que relaciona os ambientes considerados locais de frequência coletiva, onde poderá ocorrer a exibição pública sujeita à prévia e expressa autorização do autor ou titular de direito autoral.
Conclui-se, portanto, que não é pacífico o entendimento de que as igrejas estejam obrigadas ao pagamento de direitos autorais por exibição musical durante os cultos. Entretanto, o entendimento majoritário inclina-se no sentido de isentar as entidades religiosas da obrigação desse pagamento, pelo fato de não auferir lucro a partir da apresentação de composições musicais. Observa-se que na prática o escritório responsável pela arrecadação do pagamento de direitos autorais não tem promovido a cobrança em face das organizações religiosas, por exposição pública de obras musicais durante as celebrações, certamente por entender as peculiaridades dos cultos religiosos.     
           

quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

A IGREJA DENTRO DA LEI - Direito de Resposta


Por Adiel Teófilo.

As igrejas evangélicas que são organizadas como pessoa jurídica de direito privado assuem determinadas obrigações, mas também se tornam titulares de direitos que são inerentes às pessoas jurídicas. Dentre as prerrogativas está o direito de resposta ou de retificação, que pode ser exercido em face de matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social, tal como jornal, revista, periódico, dentre outros, seja impresso ou por meio eletrônico. O direito de resposta e o procedimento para o seu exercício estão previstos na Lei nº 13.188, de 11 de novembro de 2015, publicada no Diário Oficial da União do dia subsequente.
As organizações religiosas podem ser alvos de matéria injuriosa, caluniosa ou difamatória. Nesses casos, podem promover o direito de resposta ou retificação diretamente contra o veículo de comunicação social que divulgou, publicou ou retransmitiu a matéria com o conteúdo ofensivo, o que deverá ser feito de forma gratuita e proporcional ao agravo sofrido.
Da matéria considerada ofensiva
A Lei considera como matéria sujeita ao direito de resposta qualquer reportagem, nota ou notícia, cujo conteúdo atente contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem, ainda que por equívoco de informação. Não se incluem nessa definição de matéria sujeita ao direito de resposta os comentários realizados por usuários da internet nas páginas dos veículos de comunicação social.
O conteúdo pode ser dirigido tanto contra pessoa física, quanto contra pessoa jurídica, daí abranger as igrejas que possuem personalidade jurídica. A igreja ou a pessoa atingida pode estar explicitamente identificada na matéria ou mesmo implicitamente, desde que seja passível a sua identificação a partir do conteúdo divulgado.   
Do meio de divulgação e da retratação ou retificação espontânea
Para os efeitos da Lei, são alcançados todos os meios ou plataformas de distribuição, publicação, transmissão, utilizados por veículo de comunicação social para divulgar a matéria considerada ofensiva.
No caso de ocorrer retratação ou retificação da matéria de forma espontânea pelo veículo de comunicação social que fez a divulgação, mesmo que sejam conferidos à retratação o mesmo destaque, publicidade, periodicidade e dimensão do agravo, essa providência não impede que o ofendido exerça o direito de resposta, nem prejudica o direito de promover ação judicial visando a reparação por dano moral.
Do prazo e da forma para o exercício do direito de resposta
O prazo para exercer o direito de resposta ou retificação é de 60 (sessenta) dias, contado a partir da data de cada divulgação, publicação ou retransmissão da matéria ofensiva. Não sendo exercido nesse prazo, extingue-se o direito, pois se trata de prazo decadencial. No caso de divulgação, publicação ou transmissão continuada e ininterrupta da mesma matéria ofensiva, o prazo será contado da data em que se iniciou o agravo.
A primeira providência para exercer o direito de resposta é enviar correspondência com aviso de recebimento (AR), diretamente para o veículo de comunicação social que divulgou a matéria. A correspondência deve ser destinada à pessoa jurídica ou pessoa física responsável pelo veículo de comunicação social, independentemente de quem seja o responsável intelectual pelo agravo divulgado.
O direito de resposta ou retificação poderá ser exercido, de forma individualizada, em face de todos os veículos de comunicação social que tenham divulgado, publicado, republicado, transmitido ou retransmitido o agravo original. A pessoa que tem atribuição perante a Lei para exercer o direito de resposta é o representante da organização religiosa. Por isso é importante constar dentre as disposições do Estatuto a figura do representante judicial e extrajudicial da Igreja, o qual deverá ser qualificado na ata de eleição e/ou posse da diretoria da organização religiosa.
Dos critérios na publicação da resposta
A resposta ou retificação deverá atender, quanto à forma e à duração, os mesmos critérios utilizados na publicação da matéria ofensiva. Praticado o agravo através da mídia escrita ou da internet, da mídia televisa ou radiofônica, a resposta ou retificação deverá ter o destaque, a publicidade, a periodicidade, a dimensão ou a duração, da matéria que ensejou a resposta ou retificação, conforme critérios previstos na Lei, sob a pena da resposta ou retificação ser considerada inexistente.     
Na resposta deverão ser observados ainda o alcance e o horário da publicação da matéria ofensiva, e, na delimitação do agravo, considerado o contexto da informação ou matéria que gerou a ofensa. Se o agravo tiver sido divulgado em mídia escrita ou em cadeia de rádio ou televisão para mais de um Município ou Estado, deverá ser conferido à resposta um alcance proporcional ao da divulgação. Além disso, o ofendido poderá requerer que a resposta seja publicada no mesmo espaço, dia da semana e horário do agravo.
Da propositura de ação judicial para o direito de resposta
Caso o veículo de comunicação social não publique a resposta no prazo de sete dias, a contar do recebimento do respectivo pedido, a organização religiosa com o auxílio de um profissional da advocacia poderá propor ação judicial. A ação pode ser proposta tanto no domicílio da igreja ofendida, quanto no lugar onde o agravo apresentou maior repercussão contra a instituição religiosa.
A Lei estabelece que o juiz prolatará a sentença no prazo máximo de trinta dias, contado do ajuizamento da ação, exceto no caso de conversão do pedido em reparação por perdas e danos. No caso de ação temerária, a gratuidade da resposta atribuída ao veículo de comunicação, não abrange as custas processuais nem exime o autor do ônus da sucumbência, nos quais incluem as despesas com a divulgação, publicação ou transmissão da resposta ou retificação, no caso da decisão judicial favorável ao autor da ação ser reformada em definitivo posteriormente.
Destaca-se que o direito de resposta ou retificação não impede do ofendido pleitear em ação própria reparação ou indenização por danos morais, materiais ou à imagem. Assim sendo, o ajuizamento de ação cível ou penal contra o veículo de comunicação ou seu responsável que divulgou a matéria ofensiva não prejudica o exercício administrativo (direito com o veículo e comunicação) ou judicial do direito de resposta ou retificação.
Essas são as principais orientações, extraídas da Lei nº 13.188, de 11.11.2015, que trata sobre o exercício do direito de resposta ou retificação perante os veículos de comunicação social, no caso de divulgação de matéria ofensiva. Ressalta-se que a organizações religiosas podem figurar como ofendidas e consequentemente exercer o direito de resposta conforme as disposições contidas na referida Lei. 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

A IGREJA DENTRO DA LEI - Remessa de Valores ao Exterior

Por Adiel Teófilo.

Há igrejas evangélicas em nosso país que desenvolvem projetos missionários no exterior. Por isso frequentemente enviam a outros países recursos financeiros destinados ao sustento de Pastores e Missionários, bem como à manutenção de igrejas e obras assistenciais. Apesar de não encontrarem maiores dificuldades para enviar esses recursos, os representantes dessas igrejas não raras vezes têm dúvidas quanto à regularidade dessas remessas em face da imunidade tributária concedida às entidades religiosas. 

Surge assim o questionamento: as igrejas podem ou não destinar parte dos seus recursos financeiros a pessoas físicas ou a igrejas que mantém em funcionamento no exterior? Qual é a fundamentação legal que autoriza ou não proíbe essa prática? Para responder a essas indagações, precisamos analisar o tratamento jurídico que a legislação dispensa às igrejas, comparando com o tratamento dado a outras entidades que também são de direito privado, como veremos a seguir.

Da Imunidade Tributária dos Templos Religiosos

É de amplo conhecimento que as igrejas são beneficiadas com a imunidade tributária prevista no art. 150, da Constituição Federal de 1988. Além dos templos religiosos, outras entidades jurídicas também são alcançadas por essa imunidade, conforme consta do texto Constitucional que trata das limitações ao poder de tributar:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
VI - instituir impostos sobre:
[...]
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
[....]
§ 4º As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. (grifamos)

Nota-se que o legislador Constituinte, além de garantir a desoneração tributária em favor das entidades religiosas (alínea “b”), assegurou também a imunidade em favor dos partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, instituições educacionais e assistenciais beneficentes (alínea “c”). Desse modo, conforme prescreve o § 4º, essas entidades não podem ser tributadas quanto ao patrimônio, a renda e à prestação dos seus serviços, desde que esse conjunto do patrimônio, renda e serviços, esteja relacionado com as finalidades essenciais de cada uma dessas entidades.

Até aqui parece não existir distinção entre as instituições acima mencionadas. No entanto, constata-se que ao final da alínea “c” acima transcrita, consta a seguinte expressão: “atendidos os requisitos da lei”. Significa dizer que os partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, instituições educacionais e assistenciais beneficentes, para usufruírem da imunidade tributária sobre o patrimônio, renda e serviços, devem atender aos requisitos estabelecidos em lei complementar.  

Nesse sentido, o Código Tributário Nacional (CTN), instituído pela Lei nº 5.172 de 25 de Outubro de 1966, estabelece normas complementares às limitações Constitucionais ao poder de tributar. Esse Diploma Legal, com eficácia de Lei Complementar foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, por força do § 5º do art. 34 das Disposições Constitucionais Transitórias. Os artigos 9º e 14, ambos do CTN, preconizam algumas condições que devem ser cumpridas para que as entidades possam gozar da imunidade tributária, a saber:

Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
IV - cobrar imposto sobre:
[...]
b) templos de qualquer culto;
c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;    
[...]
Art. 14. O disposto na alínea c) do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;    
II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Esses dispositivos do CTN mencionam condições objetivas que devem ser atendidas, para que as entidades possam usufruir da imunidade tributária. Os requisitos a serem preenchidos são três: I – não distribuir lucros ou parcela de seu patrimônio; II – aplicar de forma integral os recursos no País e na manutenção dos objetivos institucionais, vendando assim a remessa ao exterior; III - manter escrituração regular que assegure sua exatidão.     

Cumpre fazer uma importante distinção quanto à incidência desses requisitos. Observa-se que o art. 14, do CTN, acima transcrito, não está se referindo aos “templos de qualquer culto”, mencionados na alínea “b”, inc. IV, do art. 9º. Está sim apontando no sentido de que tais exigências se aplicam exclusivamente às instituições elencadas na alínea “c”, inc. IV, art. 9º, quais sejam: os partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, instituições educacionais e de assistência social sem fins lucrativos.

Da possibilidade de remeter valores ao exterior

Fica evidente que os requisitos constantes do art. 14, do CTN, não se aplicam aos “templos de qualquer culto”. Desse modo, as instituições que se enquadram na condição de templos religiosos não se sujeitam à restrição de aplicar os seus recursos integralmente em nosso país. Essas instituições religiosas podem fazer a remessa de valores ao exterior, visando prover o sustento de missionários enviados para qualquer parte do mundo, onde os mesmos prestam serviços religiosos vinculados à instituição Brasileira, sem que isso acarrete qualquer prejuízo à imunidade tributária.  

Ressalta-se que a Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que altera a legislação tributária federal e dá outras providências, instituiu também alguns requisitos para a fruição da imunidade tributária prevista no art. 150, da Constituição Federal. No entanto, esse Diploma Legal não estabeleceu qualquer condição a ser cumprida pelos templos religiosos. A Lei em destaque impôs algumas obrigações a serem cumpridas apenas pelas instituições educacionais e de assistencial social, conforme consta no seu art. 12, caput e § 2º, abaixo transcritos:  

Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição, considera-se imune a instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.       
[...]
§ 2º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos:
a) [...]
b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;

Acrescenta-se que o Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, que Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, mencionou a imunidade tributária Constitucional concedida aos templos religiosos, referindo-se também ao Código Tributário Nacional. Contudo, não impôs qualquer condição a essas entidades religiosas para gozar dessa imunidade. O Regulamento anexo ao referido Decreto, no art. 179, assim preconiza:

Templos de qualquer culto
Art. 179.  Não ficam sujeitos ao imposto sobre a renda os templos de qualquer culto (Constituição, art. 150, caput, inciso VI, alínea “b”; e Lei nº 5.172, de 1966 - Código Tributário Nacional, art. 9º, caput, inciso IV, alínea “b”).

Nessa mesma linha, destaca-se o Decreto nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007, que Regulamenta o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários – IOF. Esse Decreto, no art. 2º, § 3o, excluiu as entidades religiosas da obrigação de pagar o IOF, desde que as operações realizadas por essas entidades estejam vinculadas às suas finalidades essenciais.

§ 3o  Não se submetem à incidência do imposto de que trata este Decreto as operações realizadas por órgãos da administração direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, desde que vinculadas às finalidades essenciais das respectivas entidades, as operações realizadas por:
I - autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público;
II - templos de qualquer culto;
III - partidos políticos, inclusive suas fundações, entidades sindicais de trabalhadores e instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei. (grifamos)

Conclui-se que não há na legislação complementar qualquer proibição no sentido de impedir as entidades religiosas de enviar recursos ao exterior. Portanto, podem remeter valores a fim de atender atividades desenvolvidas no exterior, desde que esses serviços estejam relacionados com as finalidades estatutárias da instituição religiosa. 

Da organização religiosa favorecida pela imunidade tributária

A imunidade tributária concedida aos templos religiosos não se sujeita ao cumprimento de nenhum requisito estabelecido em lei complementar. Por essa razão é de suma importância realçar a correta interpretação que se deve atribuir à expressão “templos de qualquer culto”, constante da alínea b, inc. VI, art. 150, da Constituição Federal.

O Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, refere-se a essas entidades com a nomenclatura de “organizações religiosas” (art. 44, inc. IV). Esse Código, porém, não apresenta elementos conceituais capazes de estabelecer uma correlação exata entre essa nomenclatura e aquela expressão Constitucional, muito embora os templos de qualquer culto adquiram personalidade jurídica com a nomenclatura de “organizações religiosas”. 

O vetor interpretativo deve ser o disposto no § 4º do art. 150, da própria Constituição Federal. Esse preceito não restringe a imunidade tributária apenas ao “templo” onde se realiza “culto”, como poderia sugerir o teor da alínea b, inc. VI, art. 150, da Constituição Federal. Ao contrário disso, o referido § 4º estende a imunidade tributária para alcançar o patrimônio, a renda e os serviços, desde que estejam relacionados com as finalidades essenciais da entidade religiosa, ampliando assim o alcance interpretativo da expressão “templos”.

A par dessa compreensão ampliativa, o conceito de “templos de qualquer culto” para fins de imunidade tributária deve ter os seguintes contornos: são as entidades com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, identificadas como “organizações religiosas”, que realizam cultos em templos ou em qualquer outro local, empregando patrimônio, renda e serviços integralmente na consecução das suas finalidades institucionais. São entidades que viabilizam condições necessárias ao livre exercício dos cultos religiosos, concretizando dessa forma a garantia da liberdade de consciência e de crença, direitos fundamentos previstos no art. 5º, inc. VI, da Constituição Federal.  

Por força dessa amplitude conceitual, devem ser considerados como templo por extensão, todos os demais locais onde a instituição realiza os seus cultos ou desenvolve os serviços religiosos. São consideradas também locais de culto todas as dependências integrantes do patrimônio utilizadas nas atividades essenciais da organização religiosa.

Salienta-se que esses locais de atividades e serviços religiosos podem estar situados no País ou no exterior. Existem várias entidades religiosas aqui situadas que criaram igrejas em outros países, onde Missionários ou Obreiros prestam serviços eclesiásticos em nome da organização religiosa que os enviou, cuja instituição faz a remessa de valores para o sustento desses religiosos, bem como para a manutenção dos templos e suas dependências. 

Por tudo isso é de suma importância fazer constar no Estatuto da organização religiosa, dentre as suas finalidades institucionais, a de manter financeiramente Missionários, Pastores, Obreiros ou Igrejas no exterior. Esse dispositivo estatutário tem por finalidade estabelecer o vínculo jurídico formal com a atividade fora do país, legitimando a remessa de valores ao exterior, onde a igreja desenvolve também as suas atividades e serviços religiosos.      

Por fim, conclui-se que as entidades que realizam cultos religiosos, dedicando integralmente o patrimônio, a renda e os serviços, no cumprimento das suas finalidades essenciais como organização religiosa, gozam da plena imunidade tributária estabelecida pela Constituição Federal. Além disso, essas instituições não estão sujeitas às restrições que impedem fazer a remessa de valores ao exterior, cuja operação de remessa deve ser igualmente alcançada pela desoneração tributária, pois essas instituições desenvolvem também serviços eclesiásticos no exterior, vinculados por força de disposição estatutária.